Minha história

Como você começou a tatuar?

Essa é a pergunta que quase todos os clientes me fazem. É uma história bem longa, pois já são mais de 10 anos de caminhada no mundo da tatuagem, mas minha paixão pela arte surgiu muito antes disso.

Se você tiver interesse, eu conto todos os detalhes nesse texto. Agora, se você não gostar de ler, eu posso te contar durante a sua tatuagem.

As primeiras recordações que tenho desenhando, eu devia ter mais ou menos 4, 5 anos de idade. Eu me lembro de pegar um cartaz do Dragonball Z, colocar uma folha por cima e copiar os personagens. Lembro que pedia para a minha mãe ficar desenhando para eu observar como fazia e tentava fazer igual. Um pouco mais tarde, eu comecei a desenhar carros, que também é uma das minhas paixões. Essa fase dos carros durou até minha adolescência, que foi quando eu descobri o realismo. Lembro de ver um vídeo do Charles Laveso (desenhista brasileiro) fazendo um retrato e fiquei impressionado com a quantidade de detalhes que ele conseguia colocar nos desenhos, até então nem sabia que era possível fazer um desenho à mão com tanta qualidade. Descobri que ele vendia alguns DVDs ensinando a fazer desenhos realistas do zero e comprei o kit com 3 DVDs e os materiais. Depois disso, foquei apenas em retratos, desenhava meus amigos, parentes e pessoas famosas que eu admirava. Minha forma de me expressar sempre foi através dos desenhos, então sempre que eu tinha a oportunidade, nos trabalhos da escola eu desenhava alguma coisa. E também fazia desenhos para presentear quem eu gostava.

Nessa época, o desenho era só um hobby, e ficava bem atrás na minha lista de prioridades. Eu estava no terceiro ano, fazendo um curso técnico de automação industrial no SENAI, consertando e formatando computadores para ganhar um dinheirinho e tocando em uma banda de rock nos finais de semana. Meu sonho era conseguir trabalhar na área da música ou com desenhos, mas a música era quase impossível conseguir se destacar e os desenhos “não davam dinheiro”.

Então, no final do ano de 2012, quando me formei na escola, consegui passar na faculdade UNIFAL e iria começar a cursar engenharia química. Mas um pouquinho antes das aulas começarem, eu estava passando pelas etapas do alistamento obrigatório do exército e fui convocado para servir no tiro de guerra. Então, tive que trancar minha matrícula no primeiro período da faculdade, pois não seria possível passar para o noturno porque eu queria terminar o curso técnico.

Nesse meio tempo, entre esperar começar o tiro de guerra, e decidir o que eu iria querer fazer da vida, eu estava passando o tempo fazendo um desenho do James Hetfield, vocalista da banda Metallica, e desenhando as tatuagens no braço dele me despertou uma curiosidade de como eram feitas as tatuagens. Comecei a pesquisar no YouTube e fiquei muito interessado pelo assunto.

Minha primeira máquina eu fiz com um motor de carrinho de controle remoto, um botão de camisa, uma caneta desmontada e uma agulha de costura. Não contei para ninguém, pois meus pais eram totalmente contra tatuagens, então esperava a madrugada, pegava as frutas da minha mãe (melão, limão, casca de banana são ótimos para treinar) e tatuava todas.

Nessa mesma época, peguei minha pastinha de desenhos e fui em todos os estúdios de tatuagem da cidade perguntar se eles me aceitariam como aprendiz, mas eu, com meus 18 anos, cabeça raspada, cara de criança e sem nenhuma tatuagem, não passei credibilidade alguma, e nenhum deles nem sequer olharam meus desenhos.

Um tempo depois, comprei meu primeiro kit de tatuagem, também escondido. Veio com duas máquinas chinesas, algumas agulhas e algumas tintas. Quando chegou, comecei a treinar em pele de porco (comprava no açougue) e prometi para minha mãe que não iria tatuar nenhum ser humano. Na primeira oportunidade, liguei para o meu amigo Gabriel Cunha e marcamos de fechar a panturrilha dele (um dia que meus pais estavam viajando). Eu estava tão ansioso e queria tanto colocar em prática tudo que aprendi no YouTube que nem senti medo de fazer essa primeira tatuagem. Quando terminei, coloquei uma foto no Facebook e vários amigos começaram a chamar querendo tatuar também. E depois desse dia, nunca mais parei de tatuar.

Quando começou o tiro de guerra, sempre que eu era escalado para ficar de guarda, eu trocava com algum soldado e dava uma tatuagem para eles ficarem no meu lugar.

No começo, tatuava no meu quarto, colocava o pessoal deitado na minha cama, ou apoiava o braço deles em uma tábua de passar roupas. Era o que dava para fazer no começo, mas sempre que sobrava um dinheirinho, eu dava um jeito de ir melhorando meu espaço e meus materiais.

Um dos dias mais marcantes desse começo foi quando entrei pela primeira vez em um estúdio de tatuagem. Conheci o Pardal pela internet, ele tinha um estúdio em São José do Rio Pardo, e me convidou para ir até lá para ver ele trabalhando de perto. Ele foi a primeira pessoa a me ajudar, se dispor a me ensinar algumas técnicas de sombreado, e no final do dia ainda me deu uma máquina profissional (tenho até essa máquina tatuada na minha perna).

Quando começou a faculdade, meus pais várias vezes tentaram me proibir de tatuar, porque eu ficava trabalhando até muito perto da hora de ir para a aula e muitas vezes chegava atrasado. E durante a aula, eu ficava preparando os desenhos do dia seguinte. Mas não adiantou, eu sempre dava uma desculpa e dava um jeito de continuar. Consegui levar a faculdade junto com a tatuagem por dois anos e meio, até resolver focar totalmente na tatuagem.

Em novembro de 2014, aconteceu um marco na minha carreira, foi quando eu vi que isso poderia ser algo profissional e que eu realmente poderia viver da tatuagem. Fui convidado para trabalhar no Tiagão Tattoo, que na época era a maior referência na cidade e para mim, ele era uma grande inspiração. E lá eu fiquei por quase 3 anos, aprendi muita coisa com o Tiagão e o Nego, sou eternamente grato por tudo que eles me ensinaram.

Nesse meio tempo que estava no estúdio, eu fazia todos os estilos de trabalho, tribal, oriental, coberturas, delicadas, mas o que eu gostava mesmo era o realismo. Quando decidi o que eu queria me especializar, eu fui parando de agendar outros estilos. Essa transição foi muito difícil, fiquei algum tempo sem cliente nenhum, todo mundo falava que isso não ia dar certo, que tatuador tem que fazer de tudo, que era coisa de tatuador “estrelinha”. Mas eu me mantive firme nesse propósito e insisti para fazer dar certo.

Foi então que em abril de 2016, eu viajei pela primeira vez para os EUA, em busca de observar mais de perto os tatuadores que eram especialistas em realismo, e como eles conseguiam isso. Fiquei três meses por lá, foi uma experiência incrível, de muito aprendizado, e nessa viagem eu tive a “virada de chave” para conseguir me especializar no realismo. Depois que voltei para Poços, meus horários já começaram a ficar muito disputados.

Em 2017, eu decidi me mudar para São Paulo, fui trabalhar no estúdio Gellys Tattoo Sênior, e fiquei um ano por lá. Considero que aquele estúdio foi minha maior escola e onde eu mais aprendi, não só sobre tatuagem, mas sobre a vida no geral.

O estúdio era enorme, tinham 3 unidades, e na que eu trabalhava éramos em mais de 20 tatuadores, sendo 5 especialistas em realismo. Um ajudava o outro a enxergar no que melhorar, incentivava a estudar, e conversava o dia todo sobre arte. Também tive a chance de fazer amizade e aprender com tatuadores que eu nem imaginava conhecer, que até então eu só admirava o trabalho deles pelo Instagram, e de repente eu estava ali estudando junto com eles. Não tinha palavras para descrever aquela sensação!

Em 2018, eu voltei para Poços de Caldas para abrir a Tatuaria 355 junto com meu irmão Juan Carvalho. Começamos bem pequenos, como um estúdio privado, e sem pretensão alguma de crescer, mas as oportunidades foram surgindo e os planos foram mudando, e quando nos demos conta já estávamos trabalhando em mais de 10 pessoas, entre tatuadores, colaboradores e aprendizes. Nesse período também fizemos várias festas e eventos da 355, e foi quando surgiu o projeto 355 pelo mundo. Eu e o Juan fizemos algumas viagens para EUA e Europa levando o nome da 355 e até participamos da Golden State Tattoo Convention em Los Angeles na Califórnia.

Em 2020, veio a pandemia, eu e o Juan começamos a tatuar cada um no seu apartamento, para evitar o acúmulo de pessoas no estúdio. E foi então que decidimos reformar a 355 e voltar a ser um estúdio privado. No final de 2021, voltamos para nosso estúdio reformado, agora só nós dois e nossas esposas. E com essa nova forma de trabalhar conseguimos fazer nossas viagens com mais frequência, sempre em busca de conhecer novas culturas, ganhar experiência e poder trazer o melhor para nossos clientes aqui.

Agora, enquanto olho para trás e vejo toda a minha trajetória, sinto-me orgulhoso e grato por tudo que conquistei. Cada passo, cada decisão, cada desafio e superação, tudo isso me trouxe até aqui. A tatuagem, que começou como uma curiosidade e se tornou uma paixão, hoje é a minha vida. Seja através de transformar histórias em desenhos, ou fazer algo bonito e artístico, eu encontrei minha voz, minha maneira de expressar minha arte e tocar a vida das pessoas.

E quanto ao futuro? Ainda há muito a ser feito. Estou sempre buscando aprender mais, aprimorar minhas habilidades e me desafiar a ir além. Sei que a estrada ainda é longa, mas estou animado para ver onde ela vai me levar. E acima de tudo, continuar a criar tatuagens que contam histórias, que significam algo para as pessoas.